domingo, 12 de julho de 2009

Fator Mulher


Há alguns dias eu entrei no vestiário masculino do meu trabalho e reparei que meus colegas conversavam sobre mulher, comum. Sim, super comum numa indústria metalúrgica. Mas eles não comentavam sobre mulher-objeto-sexual. Mas sim sobre mulheres-homossexuais.

Na maioria das vezes eu presto atenção às meras conversas do dia-a-dia, pois sou observador, qualidade ou defeito entenda como quiser. Essa conversa especificamente eu resolvi prestar mais atenção. Não que eu tenha uma opinião formada a respeito, ou seja do tipo simpatizante com a causa, mas porque me interessei pelo polêmico tema.

Dentre os participantes da discussão estavam um evangélico, um senhor mais velho, um jovem e meus ouvidos.

Observei que eles analisavam o fato. ‘O que leva uma menina a gostar de outra menina?’ O preconceito era nítido nos olhares e reparei que todos estavam um tanto constrangidos. A primeira hipótese era a questão da simples preferência. ‘Mulher-macho’ aliás foi um termo muito utilizado. A segunda hipótese era o desgosto por homens, em que se encaixavam mulheres mal-tratadas, violentadas, molestadas e principalmente mal amadas. A terceira e última hipótese era a moda. A moda criada em torno das patricinhas principalmente, que intitulavam ‘interessante’ a relação com outras mulheres.

Ouvi atentamente as diversas opiniões, concordando mentalmente ou não e saí. Fui em direção ao relógio de ponto, porém minha cabeça continuava naquela discussão.

Então, analisei profundamente, sozinho.

Uma mulher que simplesmente gosta de outra mulher, um desejo real, ardente como fogo, sem explicação, não é uma escolha, uma decisão que foi tomada, não. É um fato, uma realidade existente, um sentimento sem controle algum. Não concordo em duas coisas: Acho errado que se crie um preconceito em cima desse tipo psicológico específico e, não necessariamente serão essas mulheres, mulheres-homens.

Acredito que existam mulheres que por decepções em relacionamentos anteriores com homens venham a buscar numa relação entre mulheres qualquer que seja o sentimento que lhes faltou. Compreendo essa situação, apesar de toda a complexidade.

A questão da moda é vulgar, eu diria até esquisita. Se encaixam aqui menininhas, em sua maioria curiosas, que levadas por opiniões se relacionam umas com as outras. O problema aqui é a sociedade, principalmente a alta. Uma mudança de hábitos, de conceitos, de criação, talvez amenizaria o problema.

Reparei que nas três situações reinam o preconceito. Deles, meu, de todos. Acredito que as coisas precisam ser reavaliadas. Temos um problema aqui, notável aliás. Pois se mulheres se sentem atraídas por outras, sem opção de escolha, não cabe a nós julgar, mas sim aceitar. Se outras percebem que uma relação com outra mulher lhes é muito mais saudável, culpa nossa, dos homens, que não sabem se portar. E se meninas se entregam a outras levadas por costumes da época, culpa da sociedade, que indiretamente dita às regras.

Então, acho que cabeças precisam ser abertas, ideias precisam ser renovadas e a compreensão precisa assumir o posto do julgamento.

domingo, 17 de maio de 2009

Tempo

‘Eu gosto muito de você e vou seguindo te amando, do meu jeito.’
Não, por favor! Não me venha com algo tão pequeno novamente, porque eu sei que eu mereço mais. Me sinto indignada, raivosa. Como você pode pensar tão pacientemente? Como pode achar que a vida é eterna e temos todo tempo do mundo pra aproveitar e viver? Te digo que não é. Te digo que não sabemos o dia de amanhã, o que nos espera no futuro, e devemos, meu Deus, devemos correr e viver; viver tudo que pudermos.
Eu quero beber, eu quero cair, rir, chorar, dormir, amar, te amar. Quero aproveitar cada segundo do tempo, do nosso mísero tempo que nos foi dado.
Eu esperava, ao menos, que fosse próximo do seu pensamento, mas não. Você insiste em dizer que eu preciso ter fé, coragem, dar tempo as coisas. Meu tempo pode acabar, o seu pode acabar; e o que teremos feito? E o nosso amor terá sido concretizado? Materializado?
Eu sinto que as coisas estão se desgastando, aliás, estão desgastadas já, e sinceramente não quero isso. Eu não quero morrer sem te tocar, sem sentir seu cheiro, seu sabor, seu amor ardente e quente. Me permita ao menos isso, por favor!
Eu te amo! Isso, talvez nem o tempo consiga apagar, minimizar. E talvez seja só por isso que ainda tento, questiono, te cobro. Eu não sei mais o que fazer, e acredito que nem tenho, pois já fiz de tudo. Acho que, pode ser um pouco culpar você, as coisas estão nas suas mãos. Então faça, pelo amor que diz que sente por mim, faça. Mostre que você pode agora, e não mais tarde, amanhã, outro tempo. Ao menos comece, queira começar, já seria meio caminho percorrido, já seria metade do amor que você diz que sente, provado.

domingo, 29 de março de 2009

A rocha

Caminho sozinho pela ponte, sentindo o vento cortante bater forte no rosto. O sol raiando no céu, quente. De um lado nada, do outro, menos ainda. Nenhum automóvel, nenhum rosto, nenhum ser. Aliás, parecia que nada nunca tinha colocado os pés por ali.

Em um único pilar de sustentação identifiquei pesadas rochas, fortes, se sobrepondo. Precisava de uma daquelas na minha vida, algo em que me apoiar. Conversei mentalmente com ela. Era tímida, mas aos poucos se abriu. Contou-me sobre como era importante sua função ali; sem ela nada ficaria em pé, a ponte nada aguentaria.

Fiquei maravilhado e invejei minimamente aquela nova amiga, que ficou horas dialogando sobre sua simples e dura e eterna função de sustentar aquela estrutura. Perguntei, enfim, porque trabalhar tanto sem poder ser prestigiada, ou ainda inutilmente, pois afinal de contas ninguém passava por ali.

Silenciou-se. Por horas não me respondeu nada. Eu permaneci quieto também, aguardando uma reação, mas não. A reação não aconteceu.

Pude perceber então uma frieza, uma tristeza; e observei que uma gota escorria por uma das rochas. Uma lágrima. Talvez. Ela finalmente falou. Disse que as coisas foram acontecendo, que no princípio ela havia sido criada para se tornar um local de grande passagem pelas pessoas, que sua estrutura era muito reforçada para aguentar esforços resultantes inimagináveis. No entanto, não suportava a situação que a solidão proporcionava.

Observei uma ansiedade, definiria melhor como desespero. Arrepiei-me. Ela continuou dizendo que a culpa era dela, que haviam sido feitas escolhas, locais onde ela seria elevada. Foi decisão minha esse lugar. Tive medo, muito medo, mas arrisquei. Notei que ela falava rapidamente, que se enrolava ao balbuciar algumas monossílabas. Arrependimento havia, talvez com certeza; mas ela se esforçou em não me demonstrar.

E desabou. Tanta força, tanto trabalho, tanto na vida, e ela desabou. Rochas pesadas, de concreto puro, não foram suficientes nesse momento. Nada seria suficiente, porque se encontrava sozinha, perdida.

Tristemente me virei, continuei a percorrer meu caminho. Logo, outra estrutura seria elevada ali e nada mais restaria da minha amiga. Ninguém sentiria nem falta, nem ao menos perceberiam que foi substituída. Triste fim, pensei. E tive medo de terminar de modo semelhante, senti um profundo medo.

Foi decisão minha esse lugar. Tive medo, muito medo, mas arrisquei. Eu já optei, se certo, se errado, não sei. A questão é onde eu chegarei? Até que ponto aguentarei?

Eu não sei.

sábado, 21 de março de 2009

Destino


Escureceu, anoiteceu, e eu permanecia ali, imóvel. O medo de me movimentar e talvez sofrer pelos ferimentos abertos, expostos, era enorme e tendia a aumentar, e aumentar. O consciente já não era mais. Inconsciente. E este desesperava-se lentamente e perigosamente. O frio, atingível até embaixo das pesadas rochas, tremia minha estrutura muscular dental, que batia. Os ruídos soavam como uma orquestra de anjos infernais e as risadas ecoavam pelo ar. Maldosas, maléficas.

Minha mobilidade não sonhava em voltar. Medo. A cada piscada de milésimos pensada me entorpecia mais, me inutilizava mais. E eu já nem sofria, nem tentava, nem sorria. Ninguém fazia nada. Nenhum deles conseguia.

Finalmente entendi a situação em que me encontrava, o sentimento que dominava e possuía meus orgãos e minha alma.

Enterro, sepulcro. Não passava de um defunto, um mero pedaço de matéria orgânica pronto para ser digerido, saboreado. E me angustiava pensar o tanto de terra que havia sobre mim e a escuridão que me devorava, feroz. Mais tenebroso ainda era pensar que não havia outra saída, nenhuma possibilidade de sobrevivência.

A vida inteira passa em segundos. Integra. Desintegra. E nem uma lágrima desce, não tem tempo, não tem ar. E aos poucos eu paro, eu morro, imobilizo, finalizo. E chego onde todos um dia irão chegar. Destino.

domingo, 15 de março de 2009

Conclusões de um piloto


- Desce!

É engraçado você observar as pessoas, principalmente quando você trabalha tão próximo a elas.

Eu sou, como muitos definem, o rapaz do elevador, mas na verdade eu sou um piloto oficial do transporte público vertical de passageiros; muito bem treinado por sinal. Minha função é transportar pessoas e seus respectivos pertences com segurança e rapidez.

Durante a realização da minha tarefa eu observo, analiso os vários tipos físicos e psicológicos que adentram minha máquina de trabalho. É hilariante.

- 7º andar. Por nada senhora, tenha um bom dia!

Existem aqueles que logo que entram se sentem em casa, sozinhos, relaxados. Logo começam a falar com o espelho. “- Nossa ein! Você tá muito gata hoje! - Minina, hoje você está no auge! – Nossa! Pego fácil, miau!” Logicamente, me sinto constrangido, é como se eu invadisse a privacidade deles, em seu banheiro por exemplo.

Há aqueles que contam “causos” de suas vidas, choram, riem, gritam. Esses na maioria das vezes estão acompanhados. “– Olha, o Carlos Alberto é um desgraçado, um ordinário, eu não aguento mais sabe!”

- Bom dia Sr. Carlos Alberto!

Alguns contam seus segredos mais obscenos, suas relações íntimas, assim dizendo. “– Olha cara, a loiraça do escritório de advocacia do 3º andar é uma delícia na cama, faz loucuras, você não pode imaginar.” Inconsequentemente eu imagino, claro.

Existem também, os com problemas de ‘claus’ sei lá o que, que logo que entram respiram fundo, fecham os olhos e começam a contar. “- Calma, uh! 1, 2, 3, 4 ..., tá chegando, uh! Calma!” E logo que chegam ao destino, saem correndo.

Tem aqueles com o celular, muito ignorantes por sinal. “- Alo? Resolveu o problema? Mas que porra, você não serve pra nada mesmo!”

Temos os educados, que só faltam deixar uma gorjeta e a benção de Deus; e os mal-educados, que nem agradecem e ainda olham de cara feia.

Os excitados são os melhores, os meus favoritos. Esses, logo que o elevador começa a andar soltam leves gritinhos. “- Ui! Ta subindo. – Nossa, que friozinho na barriga.” Alias muitos se entregam nessas horas.

Os namoradinhos, compostos pela classe jovem, com hormônios saltitantes, fazem do elevador seu local de... “– Ai amor, aqui não. – Nossa, que delícia. – Olha essa mão boba amor, o moço ta olhando.” E até parece que olhar intimida-os a ponto de parar.

- 6º, 7º e 8º, subindo!

Alguns são espaçosos demais, empurram, se mechem, enfim, incomodam. “– Porra, chega pra lá. – Ai moço, desencosta um pouquinho, ta quente!”

Os esquecidos, que entram sem saber aonde vão; tem sempre uma cara boba, de nordestinos que acabaram de realizar a migração. “– Qual andar? – Não sei. Ah, onde é mesmo? Qual o andar do Dr. Juarez? – 4º senhor.”

Temos as patricinhas, que olham a calça, a blusa, o sapato, a bunda, o decote, as unhas e por último comentam sobre o piloto, no caso eu. “– Reparo amiga? Gatinho!” Um constrangimento aceitável.

Por último, mas não menos importante, temos os passageiros bomba. Esses mesmo, os que não podem ver um local fechado, com pouca ventilação e muitas pessoas que começam a liberar seus gases. A situação é sempre muito inconveniente e nunca revela-se ao certo um culpado. “– Púúúú! Ah, mas ta de sacanagem eim! Quem teve a coragem de soltar um peido no elevador?” Pela minha vasta experiência pude observar que esses são sempre os responsáveis pela bomba, os que questionam primeiro.

Enfim, é um trabalho digno, que exige um conhecimento aprofundado na máquina e um ainda maior, acompanhado de muita paciência, nas pessoas que a utilizam.

- Até amanhã senhor, bom descanso!